Contribuinte substituído: o novo cenário do ICMS-ST no PIS/Cofins

Contribuinte substituído: o novo cenário do ICMS-ST no PIS/Cofins

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Pontos cruciais que podem mudar a apuração de PIS e Cofins em operações sujeitas ao ICMS-ST, além da figura do contribuinte substituído.

O ICMS por Substituição Tributária (ICMS-ST) é, sem dúvida, um dos maiores desafios de conformidade e gestão fiscal para as empresas brasileiras. A complexidade de sua apuração, somada às particularidades das legislações estaduais, cria um verdadeiro labirinto tributário. Desvendá-lo exige atenção constante não apenas às regras estabelecidas, mas também às reviravoltas e mudanças decorrentes de decisões judiciais e novas interpretações do Fisco.

Recentemente, a interseção entre o ICMS-ST e a apuração do PIS/Cofins foi objeto de uma série de decisões do Superior Tribunal de Justiça (STJ), seguidas por orientações vinculantes da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) e também por Soluções de Consulta da Coordenação-Geral de Tributação (Cosit), redesenhando completamente o tabuleiro do jogo. Assim, uma posição da Receita Federal do Brasil (RFB) que parecia consolidada foi revertida, criando um cenário de oportunidades significativas — e também de riscos — que muitos gestores e contadores ainda não perceberam.

Este artigo vai direto ao ponto. Com base nas análises das mais recentes e importantes Soluções de Consulta da Cosit, apresentamos os pontos cruciais que podem mudar radicalmente a forma como sua empresa lida com a apuração do PIS e da Cofins em operações sujeitas ao ICMS-ST. Vamos esclarecer o que mudou, por que mudou e qual é o impacto prático dessas novas regras para o seu negócio.

1. A exclusão consolidada (Tema 1125): ICMS-ST não compõe a base de cálculo do PIS/Cofins

A primeira e mais impactante revelação se refere à consolidação de um direito longamente disputado. Por anos, a RFB manteve uma posição rígida, expressa na Solução de Consulta Cosit nº 104/2017, de que o contribuinte substituído — o varejista ou o distribuidor que vende ao consumidor final — não poderia excluir o valor do ICMS-ST da sua receita bruta para fins de cálculo do PIS e da Cofins.

A lógica da Fazenda Nacional, detalhada no Parecer SEI nº 4090/2024/MF, era formalista: a lei permitia a exclusão de tributos não incidentes na operação, ou “cobrados, destacadamente, do comprador […] na condição de mero depositário”. Para o Fisco, apenas o contribuinte substituto se encaixava nessa descrição.

Contudo, essa interpretação foi derrubada por uma decisão judicial de peso. Conforme detalhado na SC Cosit nº 100/2025, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao julgar o Tema Repetitivo nº 1.125 (REsp nº 1.958.265/SP), pacificou a questão em sentido contrário. A tese firmada pelo STJ é clara e inequívoca:

“O ICMS-ST não compõe a base de cálculo da Contribuição ao PIS e da Cofins devidas pelo contribuinte substituído no regime de substituição tributária progressiva.”

Essa decisão de caráter vinculante obrigou a RFB a alterar sua posição. O STJ superou a interpretação literal da lei para focar na realidade econômica e no princípio da isonomia. A lógica é a mesma da “Tese do Século” (Tema 69 do STF): o conceito constitucional de receita bruta não é o valor total de uma nota fiscal, mas sim o valor que efetivamente se incorpora ao patrimônio da empresa. Isso significa que o ICMS-ST é um valor que apenas transita pelo caixa antes de ser repassado ao estado, de modo que nunca pertenceu, de fato, ao contribuinte.

O impacto prático dessa mudança é direto: uma redução na carga tributária sobre a receita do contribuinte substituído. A própria SC Cosit nº 100/2025 conclui que o montante a ser excluído é aquele destacado nas notas fiscais de venda ou o valor do imposto presumido, conforme detalhado na nota fiscal de aquisição. Essa é uma vitória consolidada que permite às empresas ajustar seus cálculos correntes e planejar a recuperação de valores pagos a maior.

2. O contraponto de equilíbrio (Tema 1231): ICMS-ST não gera crédito de PIS/Cofins

Se a primeira revelação foi uma excelente notícia, a segunda é o seu contrapeso judicial, ou seja, a outra face da mesma moeda. Funciona como um contraponto crucial e contraintuitivo: a mesma lógica que permite a exclusão do ICMS-ST da receita (débito) impõe, por imperativo judicial, um tratamento correlato na apuração dos créditos de PIS e Cofins no regime não cumulativo.

A SC Cosit nº 191/2025 esclarece essa questão com base em outra decisão fundamental do STJ, proferida no Tema Repetitivo nº 1.231 (REsp nº 2.072.621/SC). O tribunal determinou que os valores de ICMS-ST pagos na aquisição de mercadorias para revenda não podem gerar créditos de PIS e Cofins para o contribuinte substituído. As teses firmadas são as seguintes:

“i. Os tributos recolhidos em substituição tributária não integram o conceito de custo de aquisição previsto no art. 13, do Decreto-Lei n. 1.598/77; e

ii. Os valores pagos pelo contribuinte substituído a título de reembolso ao contribuinte substituto pelo recolhimento do ICMS-ST não geram, no regime não cumulativo, créditos para fins de incidência das contribuições ao PIS e Cofins devidas pelo contribuinte substituído.”

A lógica do STJ, detalhada no acórdão citado na SC Cosit nº 191/2025, é manter a neutralidade e o equilíbrio do sistema. Se fosse permitido que o contribuinte excluísse o ICMS-ST da sua receita (reduzindo o débito) e, ao mesmo tempo, aproveitasse o crédito sobre o mesmo valor em suas aquisições (aumentando o crédito), isso criaria o que o tribunal chamou de um “odioso duplo benefício”.

Para tornar isso concreto, imagine um cenário simplificado: uma mercadoria é adquirida por um varejista por R$ 100,00, cujo custo inclui R$ 10,00 de ICMS-ST. Ao revendê-la por R$ 150,00, a nova regra exige que ele exclua os R$ 10,00 do ICMS-ST tanto da sua receita de R$ 150,00 (reduzindo o PIS/Cofins a pagar) quanto do custo de aquisição de R$ 100,00 (reduzindo o crédito a aproveitar).

Operação Valor total Valor ICMS-ST BC PIS/Cofins (Débito/Crédito) corrigida
Aquisição (crédito) R$ 100,00 R$ 10,00 R$ 90,00 (crédito calculado sobre R$ 90,00)
Venda (débito) R$ 150,00 R$ 10,00 R$ 140,00 (débito calculado sobre R$ 140,00)
Operação Valor total Valor ICMS-ST BC PIS/Cofins equivocada (duplo benefício)
Aquisição (crédito) R$ 100,00 R$ 10,00 R$ 100,00 (crédito indevido sobre o ICMS-ST)
Venda (débito) R$ 150,00 R$ 10,00 R$ 140,00 (débito excluído do ICMS-ST)

Portanto, a regra é clara: ao mesmo tempo em que a empresa reduz a base de cálculo do PIS/Cofins sobre suas vendas, ela também deve, obrigatoriamente, deduzir o valor do ICMS-ST do custo de aquisição de suas mercadorias, o que resulta em menos créditos para abatimento. O objetivo do STJ foi equilibrar a balança, garantindo que a exclusão do imposto estadual fosse economicamente neutra e que o crédito fosse concedido apenas sobre o valor que compõe o custo da mercadoria, conforme o conceito fiscal-contábil.

3. Prevalência da substância: exclusão do ICMS-ST pelo contribuinte substituto, mesmo sem destaque formal na nota

A terceira revelação aborda uma situação técnica que afeta o contribuinte substituto, isto é, geralmente a indústria ou o importador. A regra geral é que a exclusão de um tributo da base de cálculo do PIS/Cofins exige seu destaque no documento fiscal. Mas o que acontece quando a própria legislação estadual proíbe esse destaque?

Em certas operações, como transferências entre estabelecimentos, a legislação de alguns estados veda o novo destaque do ICMS-ST na nota fiscal. Isso gerava insegurança jurídica: afinal, sem o destaque, o contribuinte substituto perderia ou não o direito de excluir esse valor de sua receita?

A SC Cosit nº 57/2025 trouxe a resposta definitiva, configurando uma verdadeira vitória da substância sobre a forma. A Receita Federal entendeu que a exclusão é possível, mesmo sem o destaque formal. Ou seja, a orientação reconhece que a realidade econômica — o fato de o contribuinte atuar como um “mero depositário” do tributo — prevalece sobre a formalidade procedural do destaque na nota, especialmente quando uma norma estadual torna essa formalidade impossível de ser cumprida.

A exclusão pode ser feita desde que o contribuinte consiga comprovar a incidência do imposto na operação e sua condição de repassador do tributo. Essa orientação é fundamental, pois oferece segurança jurídica e evita que o contribuinte substituto seja penalizado por uma particularidade da legislação estadual, alinhando a regra à essência do conceito de receita bruta.

4. O calendário da restituição: como a modulação de efeitos limita a recuperação do ICMS-ST

Uma das questões mais críticas em qualquer mudança de entendimento tributário é a sua aplicação no tempo. Diante disso, surge a seguinte dúvida: o direito de excluir o ICMS-ST da base de cálculo do PIS/Cofins retroage indefinidamente? A resposta é não. Além disso, é a data de corte que define o escopo financeiro de qualquer planejamento de recuperação de tributos.

Tanto a SC Cosit nº 100/2025 quanto o Parecer SEI nº 4090/2024/MF são explícitos ao detalhar a modulação de efeitos determinada pelos tribunais. O direito de excluir o ICMS-ST da base do PIS/Cofins para o contribuinte substituído só produz efeitos a partir de uma data específica: 15 de março de 2017.

Existe, no entanto, uma ressalva importante: a modulação não afeta as ações judiciais e administrativas que foram protocolizadas até 15 de março de 2017. Dessa maneira, contribuintes que já discutiam o tema antes dessa data podem ter o direito de recuperar valores de períodos anteriores.

Para a imensa maioria das empresas, o impacto prático é que qualquer pedido de restituição ou compensação de PIS e Cofins pagos a maior sobre o ICMS-ST só pode retroagir até essa data, respeitando o prazo prescricional de cinco anos.

Um novo paradigma para PIS/Cofins e ICMS-ST

As recentes decisões judiciais e as orientações da Receita Federal não foram meros ajustes, já que estabeleceram um novo paradigma na complexa relação entre ICMS-ST, PIS e Cofins. Quando analisadas em conjunto, representam um movimento do Judiciário e do Fisco em direção a uma interpretação tributária menos formalista e mais alinhada à realidade econômica, redefinindo o “tabuleiro do jogo” com regras mais neutras e lógicas.

Recapitulando, temos: a consolidação do direito à exclusão do ICMS-ST da receita do contribuinte substituído (Tema 1125); a contrapartida obrigatória da exclusão do ICMS-ST da base de cálculo dos créditos (Tema 1231), garantindo o equilíbrio sistêmico; a flexibilidade para o contribuinte substituto em casos em que o destaque na nota é vedado, privilegiando a substância sobre a forma; e, finalmente, a data de corte de 15 de março de 2017, que delimita o alcance da recuperação de tributos.

Ignorar essas mudanças significa, na melhor das hipóteses, perder oportunidades de economia fiscal e, na pior, correr o risco de autuações por cálculo incorreto de créditos. A adaptação a esse novo cenário é, portanto, urgente e indispensável para a saúde financeira e a segurança jurídica de qualquer empresa envolvida em operações sujeitas à substituição tributária.

Quer entender como essas mudanças impactam os cálculos de PIS e Cofins dos últimos cinco anos da sua empresa? Entre em contato com os consultores da BLB Auditores e Consultores para maximizar oportunidades e garantir total conformidade com as novas regras de crédito.

Autoria de Jonathan Moretto e revisão técnica de Pedro Magalhães
Consultoria Tributária
BLB Auditores e Consultores

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