Recentemente, temos acompanhado nos noticiários o escândalo da Sefaz/SP (Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo), envolvendo fiscais no suposto recebimento de propinas em valores vultuosos. E os efeitos mais amplos dessas notícias já começam a ser sentidos pelos contribuintes.
Neste artigo serão abordadas a relação entre a fraude bilionária em investigação e as mudanças que afetam créditos acumulados de ICMS e o ressarcimento de ICMS-ST.
A complexidade na geração dos arquivos de ressarcimento de ICMS-ST e o escândalo na Sefaz/SP
Quem já tentou gerar um arquivo do ressarcimento de ICMS-ST conforme as regras da Portaria CAT 42/2018, sabe quão difícil é essa missão, pois se trata de um processo muito complexo, além da burocracia e a demora para o deferimento do pedido.
A investigação do Ministério Público de São Paulo apontou que um auditor fiscal facilitava o processo de ressarcimento de ICMS para favorecer empresas. Segundo a investigação, o auditor coletava a documentação necessária de empresas, apurava os valores e assegurava que os pedidos não seriam revisados internamente. Ainda, os pedidos eram analisados com maior agilidade quando comparado aos pedidos de outros contribuintes.
Após noticiado o escândalo, a Sefaz/SP criou um grupo de trabalho para revisar todos os processos, normas e protocolos para ressarcimento do ICMS-ST. Entre as principais atribuições do grupo estão:
- Revisão de todos os processos de ressarcimento de ICMS-ST potencialmente impactados;
- Detectar falhas e irregularidades;
- Propor ajustes normativos e procedimentais para fortalecer os controles internos;
- Fornecer subsídios à Corregedoria da Fiscalização Tributária para eventual responsabilização de envolvidos.
Com essas ações, o governo paulista reafirma seu compromisso com a transparência, a ética e o combate à corrupção e aprimora os processos para evitar essas praticas irregulares, porém as medidas já tomadas impactam diretamente os bons contribuintes.
Alterações no deferimento do crédito acumulado de ICMS
No dia 19 de agosto de 2025, foi publicado o Decreto 69.808/2025, que revogou o Decreto 67.853/2023, responsável por regulamentar as contrapartidas do “Programa de Estímulo à Conformidade Tributária – ‘Nos Conformes’”. Por meio desse programa, eram concedidos “benefícios” aos chamados “bons contribuintes”, ou seja, contribuintes bem avaliados segundo critérios definidos pela legislação. Vejamos:
Artigo 1º – De acordo com a classificação atribuída no âmbito do Programa de Estímulo à Conformidade Tributária – “Nos Conformes”, nos termos do artigo 5º da Lei Complementar nº 1.320, de 6 de abril de 2018, o contribuinte classificado nas categorias adiante indicadas fará jus às seguintes contrapartidas:
I – categoria “A+”:
a) autorização para apropriação de crédito acumulado mediante procedimentos simplificados, nos termos do § 5º do artigo 72-B do Regulamento do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação – RICMS, aprovado pelo Decreto nº 45.490, de 30 de novembro de 2000;
b) renovação de regimes especiais concedidos com fundamento nos artigos 327-J, 479-A e 489 do RICMS, observando-se procedimentos simplificados, na forma e condições estabelecidas em disciplina da Secretaria da Fazenda e Planejamento;
II – categoria “A”:
a) autorização para apropriação de crédito acumulado mediante procedimentos simplificados, nos termos do § 5º do artigo 72-B do RICMS;
b) renovação de regimes especiais concedidos com fundamento nos artigos 327-J, 479-A e 489 do RICMS, observando-se procedimentos simplificados, na forma e condições estabelecidas em disciplina da Secretaria da Fazenda e Planejamento;
III – categoria “B”: autorização para apropriação de até 50% (cinquenta por cento) do crédito acumulado mediante procedimentos simplificados, nos termos do § 5º do artigo 72-B do RICMS.
Artigo 2º – Este decreto entra em vigor na data de sua publicação.
Contudo, a revogação do Decreto 67.853/2023 trará um prejuízo significativo aos bons contribuintes. Isso porque, com o procedimento simplificado aplicável a esses casos, a Sefaz/SP autorizava previamente os pedidos de crédito acumulado de ICMS antes da verificação fiscal, conforme disposto no artigo 43 da Portaria SRE 65/2023:
Artigo 43 – A autorização para apropriação do crédito acumulado, antes da verificação pelo fisco de que trata o artigo 19, para contribuinte classificado nas categorias “A+”, “A” ou “B” do Programa de Estímulo à Conformidade Tributária – “Nos Conformes”, instituído pela Lei Complementar nº 1.320, de 6 de abril de 2018, deverá observar as seguintes condições:
I – para o contribuinte classificado na categoria “A+”, será liberado 100% (cem por cento) do valor do crédito acumulado antes da verificação fiscal, dispensada a apresentação de garantia;
II – para o contribuinte classificado na categoria “A”, será liberado 80% (oitenta por cento) do valor do crédito acumulado antes da verificação fiscal, podendo solicitar o restante mediante apresentação de garantia correspondente a 20% (vinte por cento) desse valor;
III – para o contribuinte classificado na categoria “B”, será liberado 50% (cinquenta por cento) do valor do crédito acumulado antes da verificação fiscal, podendo solicitar o restante mediante apresentação de garantia correspondente a 50% (cinquenta por cento) desse valor.
Com a revogação, os procedimentos para a liberação do crédito acumulado de ICMS deixam de ter uma modalidade simplificada e passam todos ao regime comum. Nesse regime, após o protocolo do pedido de apropriação de crédito acumulado, o processo é enviado previamente para fiscalização e auditoria, de modo que o parecer final é emitido somente depois da conclusão desses trabalhos.
Alterações na utilização do ressarcimento do ICMS-ST
Além da revogação do Decreto 67.853/2023, foi publicada a Portaria SRE 45/2025, que altera as regras de utilização do ressarcimento do ICMS-ST disciplinadas pela Portaria 42/2018. Vejamos:
PORTARIA SRE 45, DE 18 DE AGOSTO DE 2025
Altera a Portaria CAT 42/18, de 21 de maio de 2018, que estabelece disciplina para o complemento e o ressarcimento do imposto retido por sujeição passiva por substituição ou antecipado e dispõe sobre procedimentos correlatos.
[…]Artigo 1º – Passam a vigorar, com a redação que segue, os incisos II e IV do “caput” do artigo 20 da Portaria CAT 42/18, de 21 de maio de 2018:
“II – Transferência para substituto tributário, inscrito neste Estado, desde que fornecedor, ou para outro estabelecimento da mesma empresa, conforme inciso II do artigo 270 do RICMS;” (NR);
“IV – Liquidação de débito fiscal do estabelecimento ou de outro do mesmo titular, observadas, no que couberem, as regras dos artigos 586 a 591 do RICMS;” (NR).
Artigo 2º – Esta portaria entra em vigor na data de sua publicação.
A primeira alteração para a utilização dos valores a serem ressarcidos de ICMS-ST foi a seguinte:
Antes da alteração, o valor ressarcido pelo Fisco paulista poderia ser transferido para qualquer estabelecimento inscrito no cadastro de contribuintes do estado, desde que cadastrado como sujeito passivo por substituição tributária e com situação cadastral ativa.
Após a mudança proposta, o valor ressarcido só poderá ser transferido para contribuintes paulistas, desde que seja para um fornecedor ou para um estabelecimento da mesma empresa.
A outra alteração refere-se a:
Antes dessa alteração, era possível liquidar o débito fiscal tanto do próprio estabelecimento quanto de outro do mesmo titular ou, ainda, do estabelecimento de terceiros. Agora, com a nova regra, apenas os débitos do próprio estabelecimento ou de outro do mesmo titular podem ser quitados com os valores ressarcidos pelo Fisco.
Infelizmente, como ficou exposto, em decorrência do escândalo da Sefaz/SP, as novas regras afetam muito o dia a dia dos contribuintes com crédito acumulado de ICMS e ressarcimento de ICMS-ST. Assim, mais uma vez a história se repete: os bons contribuintes “pagam” pelas falhas dos outros.
Para maiores informações sobre Crédito acumulado de ICMS e Ressarcimento do ICMS-ST (Portaria CAT 42/2018), sugerimos a leitura de nossos e-books.
Quer saber mais sobre este tema? A BLB possui uma equipe experiente e especializada sobre tributos estaduais, federais e municipais. Entre em contato conosco!
Autoria de André Luiz Moiz e revisão técnica de Pedro Magalhães
Consultoria Tributária
BLB Auditores e Consultores