Ao longo deste artigo, resumiremos os aspectos mais gerais da incidência do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), previstos na Emenda Constitucional 132/2023 e instituídos pela Lei Complementar 214/2025, com foco nos pontos que são comuns a esses dois tributos. Tal estudo tem como base o modelo teórico da regra-matriz de incidência tributária.
Norma e incidência de IBS e CBS
Em primeiro lugar, é importante definir dois conceitos fundamentais para a compreensão desse modelo teórico: norma e incidência.
Definiremos norma, de forma simplificada, como um texto jurídico prescritivo. Trata-se de um texto por ser expresso em forma escrita; é jurídico por estar inserido no sistema jurídico, por meio de um procedimento previamente estabelecido; e é prescritivo por atender à estrutura: “SE <condição>, ENTÃO <consequência>”.
Em relação a essa forma prescritiva, na sua “condição”, geralmente encontraremos algum acontecimento que ocorre em um lugar e um momento específicos. E na consequência, geralmente encontraremos uma obrigação entre sujeitos, que terá como objeto uma prestação (um dar, um fazer, um não fazer etc.).
Nessa definição adotada, a norma pode ser composta por parte de um dispositivo legal (um artigo, um inciso etc.), por um dispositivo inteiro, ou por combinações desses elementos, desde que possa ser expressa na forma prescritiva “SE <condição>, ENTÃO <consequência>”.
O outro termo a ser definido é o de incidência. Aqui, ele será entendido como a transcrição da condição de uma norma em um texto jurídico, com forma previamente estabelecida, para que, assim, a consequência possa ser formalmente estabelecida.
Um exemplo didático de incidência seria o seguinte: SE <matar alguém>, ENTÃO <estará sujeito à pena de reclusão de seis a vinte anos> (Código Penal, artigo 121). Em termos jurídicos, a incidência dessa norma somente ocorrerá quando, após um processo legal, uma decisão judicial for proferida e tiver transitado em julgado, relatando o ocorrido e impondo a consequência.
No âmbito tributário, a incidência ocorre com o ato do lançamento, que, conforme prescreve o artigo 142 do Código Tributário Nacional (CTN), constitui o crédito tributário. Em relação a isso, a Lei Complementar 214/2025 vincula o lançamento à apuração:
“Art. 45. Para cada período de apuração, o contribuinte deverá apurar, separadamente, o saldo do IBS e da CBS […] § 4º A apuração realizada nos termos deste artigo implica confissão de dívida pelo contribuinte e constitui o crédito tributário.”
Dessa maneira, ainda que na sequência trataremos da incidência, tal questão será abordada de forma abstrata, porque ela somente ocorrerá quando a norma for traduzida por meio da forma legal prescrita pela legislação.
Regra-matriz de incidência tributária
Com essas duas definições simplificadas, podemos definir “regra-matriz de incidência tributária” como a norma de estrutura similar, entre todos os tributos, que acarreta, em sua consequência, o dever de pagar um dado tributo.
Essa estrutura similar divide a condição e a consequência da norma da seguinte forma:
Assim, passaremos a analisar os aspectos mais gerais e comuns ao IBS e à CBS com base nesse modelo teórico.
Critério material de IBS e CBS (fato gerador)
Conforme já adiantado, e de forma simplificada, a condição de uma norma é geralmente composta por um acontecimento que ocorre em um determinado momento e lugar. Esse acontecimento pode ser identificado como uma construção formada por um verbo e um complemento. Para o IBS e a CBS, os verbos são fornecer e importar, enquanto o complemento é operações onerosas com bens materiais, bens imateriais, direitos ou serviços (LC 214, artigos 4º e 63).
De acordo com a LC 214/25 (artigo 3º, inciso II), fornecer é: (a) entregar ou disponibilizar, se o complemento for bem material; (b) instituir, transferir, ceder, conceder, licenciar ou disponibilizar, se o complemento for bem imaterial, inclusive direitos; e/ou (c) prestar ou disponibilizar, se o complemento for serviço. Então, notem que “fornecer” é um ato que tem uma direção clara que vai DE quem pratica PARA o destinatário.
Já o verbo importar é, segundo a LC 214/25, artigos 64 e 65: (a) a entrada de bens de procedência estrangeira no território nacional, se o complemento for bem material; (b) o fornecimento realizado por residente ou domiciliado no exterior cujo consumo ocorra no país, se o complemento for bens imateriais, direitos ou serviços.
Em relação à parte do complemento referente a “operações onerosas”, a LC 214/25 (artigos 4º, caput e § 2º, e 5º) define tal ideia como: aquelas operações em que há uma contraprestação, mesmo que não haja lucro ou que seja realizada a valor abaixo de mercado. E isso não poderia ser de outra forma, em razão da noção de capacidade contributiva do artigo 145, § 1º da Constituição Federal, assim expressa:
Realizar o princípio pré-jurídico da capacidade contributiva absoluta ou objetiva retrata a eleição, pela autoridade legislativa competente, de fatos que ostentem signos de riqueza. Esta é a capacidade contributiva que, de fato, realiza o princípio constitucionalmente previsto. (CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 24. ed. São Paulo: Saraiva, 2012)
Em relação à parte do complemento referente a bens materiais, bens imateriais, direitos ou serviços, todos são conceitos de direito civil, e, conforme prescreve o CTN, artigo 110, a lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado.
Isso ganha contornos importantes, uma vez que a LC 214/25 (artigo 4º, § 2º) traz uma lista exemplificativa com uma série de operações consideradas “fornecimento oneroso”, como locação, licenciamento, concessão, cessão, mútuo oneroso, instituição onerosa de direitos reais, arrendamento, inclusive mercantil, entre outros; todos, conceitos também constantes na legislação civil.
Além disso, a legislação (LC 214/25, artigo 5º) também equipara algumas operações a fornecimento, como: (a) fornecimento oneroso ou não a parte relacionada; (b) brindes ou bonificações que não constem de documento de venda e dependam de evento posterior, ou estejam sujeitos à alíquota específica; e (c) devolução de capital de bem que deu direito a crédito.
De acordo com o CTN, artigos 4º e 117, e a LC 214/25, artigo 4º, §§ 3º e 4º, a caracterização de fornecimento ou importação não depende: (a) da natureza, forma ou denominação jurídica adotadas; (b) da validade e dos efeitos jurídicos; e (c) do cumprimento de exigências legais, regulamentares ou administrativas. Em outras palavras, o acontecimento de fato da condição descrita na regra-matriz de incidência é suficiente para que a condição possa ser instaurada pelo lançamento.
No mais, a legislação exige que cada fornecimento seja discriminado na NF, exceto quando sujeitos ao mesmo tratamento tributário – isto é, o mesmo tratamento aqui significa o mesmo regime, o mesmo momento e local de incidência, o mesmo sujeito passivo, a mesma alíquota e a mesma regra de creditamento (LC 214/25, artigo 7º). Mas, se algum dos fornecimentos for considerado principal em relação aos demais, esse conjunto será considerado como único, ou seja, com aplicação do tratamento correspondente a esse fornecimento principal.
Essa última parte, referente ao fornecimento principal em relação aos demais, é um ponto bastante interessante e ainda pendente de maior exemplificação pelo regulamento. Porém, desde já, o que a legislação indica é que são considerados fornecimentos acessórios aqueles que sejam condição ou meio para o fornecimento principal. Isto é, fornecimentos que, embora possam ser valorados individualmente, somente são realizados como meio para algo maior ou principal.
Critério espacial de IBS e CBS
Um outro componente da condição da norma geralmente é o local onde o acontecimento ocorreu. Aqui cabe lembrar que a CBS é uma contribuição cuja competência para instituí-la foi atribuída à União, enquanto o IBS é um imposto cuja competência foi atribuída de forma conjunta aos estados, ao Distrito Federal e aos municípios (CRFB/88, artigo 156-A e 195, inciso V).
Isso significa que para a CBS não haverá maiores dúvidas: o local é o território nacional. Agora, para o IBS, é importante termos em vista a noção de tributação no local de destino (CRFB/88, artigo 156-A, § 1º inciso VII e artigo 195, inciso V e § 16). Assim, tanto a Unidade Federativa (UF) quanto o município de destino do fornecimento ou da importação serão competentes para exigir o IBS.
E aqui uma distinção importante é necessária: adquirente é diferente de destinatário (LC 214/25, artigo 3º, incisos IV e V). Adquirente é quem paga ou em nome de quem se paga. Destinatário é quem de fato recebe o bem, o direito ou o serviço. A legislação tem seu foco aqui no destinatário, atribuindo à UF e ao município do destinatário o direito ao IBS. É na UF e no município do destinatário que se considera que o fornecimento ou a importação ocorreu.
Critério temporal de IBS e CBS
O outro componente da condição da norma é o momento em que o acontecimento ocorreu. Aqui, a regra geral trazida pela legislação é a de que será considerado ocorrido o fornecimento quando houver o seu término, isto é, ao seu final (LC 214/25, artigo 10).
Mas a legislação traz algumas particularidades que vale a pena mencionar:
SE não for possível identificar o momento do término | ➝ | Quando se torna devido o pagamento. |
SE houver pagamento antecipado antes do término | ➝ | Antecipação de IBS e CBS sobre o valor do pagamento, com alíquota vigente na época do pagamento; os pagamentos serão considerados antecipações para abatimento no término ou créditos para o desfazimento do fornecimento. |
SE houver transporte de carga iniciado no país | ➝ | Momento de início do transporte. |
SE houver transporte de carga NÃO iniciado no país | ➝ | Momento do fim de transporte. |
SE houver importação de bens materiais |
➝ |
Momento do despacho aduaneiro. |
SE houver aquisição pela administração pública | ➝ | Momento do pagamento. |
Critério pessoal de IBS e CBS
Se algo acontecer em algum momento e local que seja condição de uma norma, então a consequência geralmente será a instauração de uma obrigação entre sujeitos, que terá por objeto uma prestação (um dar, um fazer, um não fazer etc.).
Na consequência da regra-matriz de incidência tributária, teremos sempre uma obrigação na qual o sujeito que mantém relação pessoal e direta com o acontecimento, prescrito na condição, fica obrigado a pagar para o ente público competente, que, por sua vez, tem o direito de exigir esse valor.
Sendo assim, teremos na consequência os sujeitos ativos (quem pode exigir a obrigação) e passivos (de quem pode ser exigida a obrigação), vinculados por uma obrigação na qual o sujeito passivo tem o dever de pagar um determinado valor para o sujeito ativo. Esse último, em contrapartida, pode exigir esse valor administrativa e judicialmente.
Para a CBS, o sujeito ativo será a União, enquanto para o IBS os sujeitos ativos serão a UF e o município de destino. Já o sujeito passivo será, tanto para a CBS quanto para o IBS, o fornecedor ou o importador.
Segundo o artigo 21 da LC 214/25, entende-se como fornecedor a pessoa física ou jurídica que realize o fornecimento no desenvolvimento habitual de suas atividades ou em volume que caracterize atividade econômica, ou, ainda, de forma profissional, mesmo que se trate de atividade ou profissão não regulamentada. Uma vez caracterizado o fornecedor, o fornecimento estará sujeito à incidência de IBS e CBS, mesmo que tenha ocorrido no exercício de atividade econômica não habitual.
Em relação à caracterização do importador, a LC 214/25 (artigos 64, § 5º, incisos V e VI, e 72) traz as seguintes regras: (a) em se tratando de importação de bens imateriais, direitos ou serviços, o importador será o adquirente, mas, caso o adquirente resida ou seja domiciliado no exterior, então o importador será o destinatário localizado em território nacional; e (b) em se tratando de bens materiais, o importador será quem promover a entrada do bem de procedência estrangeira em território nacional.
Critério quantitativo de IBS e CBS
O núcleo da obrigação expressa na consequência da norma é uma prestação. E no caso da regra-matriz de incidência tributária, essa prestação será o pagamento do tributo, cujo valor pode ser quantificado pela fórmula “base de cálculo x alíquota”.
A base de cálculo tem relação direta com o critério material, dimensionando-o. Nesse ponto, a legislação estabelece o seguinte:
Fornecer | ➝ | Valor da operaçãoIntegra a BC: ajustes + juros + multas + encargos e acréscimos + desconto condicional + tributos, preços ou tarifas suportados pelo fornecedor + frete + seguros + outras despesas.
NÃO integra a BC: IBS, CBS, IPI, descontos incondicionais – aqueles constantes na NF, inclusive de programa de fidelidade –, reembolsos e ressarcimentos em operações por conta e ordem de terceiros, Cosip, e, enquanto existirem, ICMS, ISSQN, PIS e Cofins, além de PIS e Cofins-importação. |
Importar | ➝ | Valor aduaneiro II + IS + taxa Siscomex + AFRMM + Cide combustíveis (se aplicável) + direitos antidumping + direitos compensatórios + medidas de salvaguarda + quaisquer outros impostos, taxas, contribuições ou direitos incidentes sobre os bens importados até a sua liberação.NÃO integra a BC: enquanto existirem, IPI, ICMS e ISSQN. |
Para o IBS, a alíquota a ser aplicada é a da UF e do município de destino. A regra estabelecida é que, para todo e qualquer fornecimento em uma UF ou um município, a alíquota seja a mesma. Contudo, poderá haver diferença entre UFs e entre municípios, podendo cada um desses entes fixar sua alíquota acima ou abaixo da alíquota de referência. E, na falta de uma lei específica, aplica-se a alíquota de referência.
As alíquotas de IBS terão um período de testes em 2026, fixadas em 0,1% para a competência estadual. Já em 2027, a alíquota se manterá no mesmo 0,1%, porém será dividida em 0,05% para as UFs e 0,05% para os municípios. De 2028 em diante, a alíquota deverá ser fixada pelas UFs e pelos municípios.
Por fim, o que se tem atualmente sobre esse tópico é uma estimativa de que a carga tributária final será de aproximadamente 28% (vinte e oito por cento), conforme indicado na Tabela 1 da Nota técnica SERT/MF sobre alíquotas, de 1º de julho de 2024.
Resumo da incidência de IBS e CBS
Em resumo, de forma simplificada, a regra-matriz de incidência do IBS e da CBS pode ser desenhada da seguinte maneira, destacando-se os pontos comuns aos dois tributos:

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Autoria de Pedro Magalhães
Consultoria Tributária
BLB Auditores e Consultores